19 de dezembro de 2007

2º Ziperona Fest

Dia 30 de novembro Brasília contou com um evento eletrizante. Realizado no Polivalente, o 2º Ziperona Fest não deixou a desejar. O primeiro show iniciou às 20h19, e já havia um público bom, apesar da chuva que impediu muita gente de chegar mais cedo.
A Molécula Tônica abriu o evento. É uma banda de ska super divertida e incrementada. O sax, o trompete e o trombone compõem o som, todo mundo mexeu os pezinhos ao som dos metais.
As músicas têm temas variados, experiências do cotidiano, amor, coisas que o público com certeza se identificou. Música só com instrumental também fez parte do repertório.
Os covers fizeram sucesso: Superman do Goldfinger, Hell do Squirrel Nut Zippers (o preferido da banda) e A message to you Rudy dos Specials. O público agitou bastante com essas músicas.

A idade dos integrantes é muito variada também. Vai desde 15 anos, o vocalista, até 26 anos, o trompetista. É legal porque dá um espaço para criar uma diversidade de público.
João, o saxofonista, conta que aprendeu a tocar por causa da banda e há apenas dois meses. No final desse ano completam dois anos de existência, e com certeza ainda virão muitos mais dois anos pela frente. Bandas boas de ska estão em falta na cidade, com certeza a Molécula Tônica vai crescer bastante. Guardem esse nome.
Sem Fim foi a próxima a se apresentar. O setlist foi com as músicas novas do EP que lançaram lá no evento.
O som é denso, rápido. Era notável que o público estava curtindo a banda. Porém deu a impressão que o tempo do show foi curto, eles podiam ter tocado também músicas do outro EP.
Logo depois foi a vez do show do Casa 7. Rolaram até gritinhos do público feminino quando eles subiram no palco. Elas seguravam mini cartazes, era o dia do aniversário de um dos guitarristas da banda.
Os garotos são enérgicos. Pulam o tempo todo, não ficam parados tocando, a atitude no palco é muito bacana. E complementa o som pesado e regado a solos de guitarra.
O título de uma música da Promessa resumiu a apresentação deles na noite: foi um “Abalo Sísmico”! Apesar de não possuírem CD lançado, o público mostrou conhecer as letras. O que não faltou foi gente cantando junto. Ao contrário dos outros shows, o público ficou mais na frente do palco, estavam bem à vontade.
O sucesso das músicas da banda é devido à internet. O vocalista comentou sobre isso durante o show, disse que hoje todos têm acesso ao som que eles fazem graças a esse recurso. A internet democratiza a cena musical, todo mundo tem o seu espaço para divulgação.
Cárdia veio com a emoção. A banda toca um hardcore pesado entupido de sentimento. Dá para sentir isso pelas feições do vocalista durante o show.
O público estava super animado. Pularam, fizeram airguitar, cantaram as letras... A banda tocou também os primeiros sucessos, como “Pretérito Imperfeito”. Foi um show completo, sem espaço para reclamações.
E finalmente começou a grande atração da noite, a banda curitibana Sugar Kane. O show foi muito melhor do que o esperado. Dez anos na estrada não é para qualquer um. A cena musical está cada vez maior, há muita renovação musical. Manter-se na ativa por tanto tempo é para privilegiados de um som digno.

Capilé resume o sucesso da banda na palavra persistência. Vini diz que continuam tanto tempo juntos por não saberem fazer outra coisa. Mas a verdade é que a energia que o Sugar Kane passa durante o show mostra que a banda tem garra, um ingrediente fundamental para seguir na estrada do Rock. O curioso é que Vini vive em um universo paralelo durante os primeiros dias da semana. Ele tem família e é dentista. Nos finais de semana vira rockeiro de uma mega banda do underground hardcore brasileiro. É o único do grupo que não mora definitivamente em SP.

Depois do show Capilé e Vini responderam algumas perguntinhas:

O nome do CD de vocês novo, o D.E.M.O, é muito fera. Da onde veio essa idéia do nome?
Capilé: Na verdade a idéia veio do Vini. A gente tava pensando sobre o nome do cd. A gente queria alguma coisa que ao mesmo tempo representasse o nosso recomeço com uma demo, já que a banda parou um ano.
Vini: Parou e mudou de formação, virou outra banda.
Capilé: É, e a gente tinha o lance de tipo falar, porra, que a gente vai fazer agora? Qual vai ser o nome do disco? Era muito importante isso. Então começamos a associar várias coisas. Era D.E.M.O de demo, diabo, e de diversão esquizofrênica para mentes ociosas.
Vini: É o emo do capeta! (risos)
Capilé: (risos) Acabou felizmente saindo muito bem com o conceito do disco.

E o que motivou vocês a voltarem depois de um ano de banda parada?
Capilé: Acho que principalmente a gente ter ficado um ano parado. Ter voltado a ter uma vida que não era do rock deixou a gente muito mais louco do que quando a gente estava dentro do rock. Não tem como conviver longe disso.
Vini: Nós aqui, pensa que rockeiro é doidão, não imagina como é muito mais louco, muito mais esquizofrênico, você não ser doidão. (risos)

E tendo como referência a cena underground do Paraná. Vocês acham que é muito diferente de Brasília?
Capilé: Não, na verdade eu acho que Brasília é muito parecida com Curitiba, a cidade de onde a gente veio. Tipo, tem um lado das bandas acreditarem muito mais no som. Curitibano tem esse lado que nem Brasiliense de dar a vida a banda. É a segunda vez que a gente toca aqui e todas as vezes foram muito boas. Acho que não tem muita diferença, as bandas são muito boas também. Eu acho que independente do lugar que você vai no Brasil sempre existe uma galera que é muito parecida... Não muda tanto de uma cidade pra outra.
Vini: Na verdade a internet destruiu todas as distâncias. Então você pode ir para qualquer lugar, que sempre vai ter uma pessoa ou outra que gosta do teu som, conhece pelo menos o teu som assim... E isso é importante pra gente porque a mensagem que a gente acredita está chegando na galera. Pô, e Brasília chegou de uma maneira muito grande pra gente. Ter 300 pessoas no show já é irado, é mais do que a gente esperava.

E é só acessar o flickr do Ruído para ver mais fotos do evento!

3 de dezembro de 2007

Vontade: único pré-requisito para se tornar produtor

Ter coragem é o mínimo necessário para enfrentar a empreitada de abrir uma produtora de shows independente. Os eventos não são financeiramente vantajosos, mas a sensação de fazê-los dar certo é o vício. O que move esse ramo é a vontade, é o amor. Entra nele quem gosta de música e quem tem a cabeça no lugar para dar a volta por cima no prejuízo.

“A gente faz por amor mesmo, por vontade de divulgar as bandas, ou fica inventando estratagemas pra sair no zero a zero no evento. A gente faz porque gosta, pelos novos contatos que surgem, porque a gente sabe que ainda tem muito a aprender também.” São palavras da jovem produtora Jacqueline Bittencourt. Ela tem 21 anos e cursa Artes Plásticas na Unb.
Sua primeira produtora foi a “Esteria”, que funcionou como uma escola de produção de eventos. Hoje ela faz parte da Footsteps, que já é maior, mesmo sendo da cena independente.
A cidade teve uma agitação cultural muito forte anos anos 80, Jacque, como é conhecida, sentia falta disso. E esse foi um motivo a mais para ela ter vontade de fazer parte do ramo.
As produtoras que Jacque participou já trouxeram bandas de outros estados para Brasília. Ela diz que "lucrar mesmo com show local, especificamente, é quase impossível".
A cada dia que passa mais jovens têm vontade de produzir shows, o interesse pelo assunto é bastante crescente. A entrevista com a Jacque nos ajuda a ter uma noção de como funciona esse mundo.

A primeira produtora que você participou foi a Esteria. De onde veio a vontade de abrir uma produtora de bandas e eventos?
Eu e minha irmã mais nova, Mariana, sempre acompanhamos a trajetória do nosso pai o ajudando nos vários trabalhos que ele já teve. Entre esses trabalhos os que a gente mais curtia eram a loja de música, a escola de música e suas épocas de DJ e produtor. Eu acho que a vontade, procurando uma origem remota, veio daí.
Um dia a Mariana começou a ouvir e comentar sobre as bandas independentes de hardcore da cidade, que eu já não ouvia tocar desde 2000, na época dos festivais da Prótons no Sesc. A iniciativa veio totalmente dela. Começou a me mostrar as bandas, conhecer e me apresentar os músicos, e um dia sugeriu de fazermos um evento com bandas pra comemorar o aniversário de uma amiga dela. Foi a “Festa da Fifi”, em setembro de 2005, que reuniu bandas locais. Com essa festa a gente começou a aprender a contratar som, local, tentar patrocínio, divulgar, todas essas coisas.
Acho que a Esteria foi um marco legal. Só meninas, e na sua maioria menores de idade, que conseguiram fazer acontecer alguns bons eventos. Acho que as pessoas pensaram depois disso: “se elas conseguem, a gente consegue também”.
Quais foram os maiores obstáculos na hora de abrir uma produtora com pessoas tão jovens e sem muito capital?
Ser levado a sério pelas pessoas que contratamos era um obstáculo. O primeiro evento, a Festa da Fifi, quase não aconteceu por um descrédito dos donos do salão do evento, que acharam que não ia rolar. No segundo, a Esteria Fest, o cara do som chegou horas atrasado.
A Esteria já não existe mais. Por que não deu certo? A falta de experiência foi o que mais pesou?
A Esteria funcionou como um workshop, uma escola mesmo para produção de eventos. Não dá pra tirar o mérito dela, ela nos deu a experiência necessária pra continuar. A gente só se separou por diferença de interesses mesmo.
Atualmente você participa da Footsteps, que apesar de ser da cena underground já era uma produtora maior que a Esteria. Como foi a sensação de receber o convite para participar dela?
Foi muito legal. Nós três pensamos bem diferente, mas entramos em acordo com bastante tranqüilidade. Acho que muitos bons frutos ainda virão da Footsteps.
Hoje em dia quais são as maiores dificuldades dentro desse universo?
O mais complicado em Brasília, em matéria de produção é espaço. São poucas casas, algumas outras com acordos de bilheteria que não valem à pena. Espaços públicos são mais difíceis e burocráticos de conseguir, e ainda não alcançamos o know-how necessário pra aprovar projetos junto ao governo. Fazer eventos em locais centrais, numa cidade planejada é complicado. Achar um lugar acessível ao público, que não incomode os vizinhos e seja financeiramente viável de produzir é o maior desafio.

Como é conciliar a vida corrida do mundo universitário com a produtora?
Fazer eventos em época de avaliações e provas nem pensar, né? Mas a impressão que me dá é que quem trabalha com isso tem uma inquietação inerente. Todo mundo é super multimídia: um estuda jornalismo, tem banda, faz cursos a tarde e produz; o outro trabalha, estuda musica e produz, já cheguei a trabalhar em dois lugares e estudar, acho que me ocupar assim é uma maneira de acompanhar a agilidade do surgimento de idéias novas na minha cuca.
Qual foi a sensação quando trouxe pela primeira vez uma banda de outro estado?
A primeira banda que ajudamos a trazer foi o Envydust, de São Paulo, num show do Ian da Reverso, no qual a Esteria entrou como apoio. É muito legal mesmo, trocar idéias com alguém do mesmo universo musical, mas de outra cidade. Nesse caso então, a sintonia foi muito bacana, os meninos da banda se deram super bem com a produção, e foi ainda mais divertido. Foi bacana também por gostarmos do som deles bastante.
O público ganha muito com esses shows, que não são muito caros e sempre são divertidos. Mas e os produtores, têm um retorno financeiro considerável?
Bem, shows só com bandas locais são muito difíceis de não dar prejuízo. O número de pessoas que prestigiam não é sempre suficiente pra se cobrir todos os gastos. Os shows com banda de fora dão certo retorno, mas ele não é grande, se for pensar no trabalho que dá, na gasolina, recepção da banda etc. Também o público vai ficando cada vez mais exigente a cada show, querem um bom show, com boa estrutura, ingresso e local acessível. Acho que essa é uma característica do público de Brasília, ser crítico. Isso é muito bom, mas com o passar do tempo pode voltar a enfraquecer o número de manifestações desse tipo na cidade, se as pessoas não prestigiarem o trabalho. A gente vai vendo isso acontecer e vai se desdobrando pra divulgar melhor, manter a qualidade, gastando menos dinheiro. É bem complicado.
As produtoras independentes vêm movimentando muito a cena musical de Brasília. Hoje muitos jovens estão criando coragem para esse tipo de empreendimento, e é até considerável o número de produtoras menores que já existem. A que você atribui esse sucesso que acabou virando a maior fonte de entretenimento da cena underground da cidade?
A vontade de sair do ócio mesmo, de ver acontecer. E eu acho isso muito lindo, essa força de vontade, é quase sei lá, um resgate ideológico daquele lance do “faça você mesmo”. Dá pra ver isso na galera que produz shows, no pessoal que monta bandas, que faz artesanalmente seus próprios CDs, no pessoal que produz roupas, acessórios, nas iniciativas das rádios livres na internet, zineiros e blogueiros, de fazer o próprio negócio e próprio marketing. Acho que a internet é muito responsável pela reunião de toda essa produção cultural, e eu espero que tenha muito mais por vir daí.